Há milhares de anos as cavernas têm exercido importância para a humanidade, oferecendo abrigo, fornecendo água e sendo associadas tanto à veneração quanto ao temor. Em momentos históricos, também desempenharam papéis singulares, como quando serviram de proteção para a obra Moça com Brinco de Pérola, de Johannes Vermeer, durante o fim da Primeira Guerra. Além de seu valor cultural, as cavernas estão ligadas a diferentes setores da sociedade: atuam como reservatórios hídricos, fornecem minerais essenciais para a construção de cidades e influenciam diretamente os solos que sustentam parte da produção de alimentos.

  1. Como surgem as cavernas?

  Uma caverna é, de forma simples, qualquer cavidade natural na rocha com dimensões que permitem o acesso de seres humanos. 

  Mas a pergunta que fica é: como a natureza consegue escavar a rocha e criar esses túneis e salões gigantescos?

  A resposta é que a  maioria das cavernas não surgem por pressão ou explosão, mas sim, lentamente, por um processo químico chamado dissolução. Nesse processo a rocha é deteriorada pela água; em outras palavras, a dissolução das cavernas é um processo em que a água ácida dissolve rochas solúveis como calcário. 

   Dessa forma, o processo de formação de cavernas inicia-se em rochas calcárias que por natureza possuem rachaduras abundantes. Assim, a água ácida, proveniente da chuva penetra nessas fraturas e, ao dissolver a rocha, vai alargando essas aberturas. Quanto maior a abertura, mais água entra, e o processo de escavação da caverna tende a se acelerar cada vez mais.

Para o entendimento melhor desse processo, separamos um vídeo que simula o processo de formação da caverna. Veja abaixo:

  1. A importância das cavernas para a sociedade e o curso interdisciplinar realizado no Vale do Ribeira. 

   A ciência que explora e é responsável por estudar as cavernas é a espeleologia. Apesar de sua riqueza, a área ainda enfrenta certa desvalorização no Brasil, evidenciada pelas repetidas tentativas de flexibilizar a regulamentação voltada à conservação das cavernas, mesmo diante dos esforços contínuos da Sociedade Brasileira de Espeleologia.

  Nesse cenário, professores e cientistas do Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo desenvolveram uma iniciativa inovadora: o curso de formação continuada “As cavernas como tema interdisciplinar para professores do Ensino Fundamental”, direcionado à rede pública estadual da região do Vale do Ribeira.

     Nesse sentido, o curso amplia a gama de conhecimentos de professores e alunos, oferecendo bases para discutir aspectos físicos, químicos, sociais, históricos e culturais relacionados às cavernas.

  Agora, você pode estar se perguntando, “o que o Vale do Ribeira tem de tão especial para sediar esse curso?”. E a resposta é muito simples: a grande concentração de cavernas, a preservada Mata Atlântica e os atrativos naturais turísticos, como cachoeiras, rios e trilhas.

        Não à toa: a região abriga o famoso PETAR, o Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira, considerado um dos maiores conjuntos de cavernas da América Latina e patrimônio natural e cultural de enorme relevância. 

                  Então, para que você, leitora ou leitor, não fique de fora, separamos aqui alguns dos pontos principais que os professores passaram a conhecer. 

           Primeiro, entenderam melhor o que é o chamado carste, este termo está historicamente e cientificamente ligado à um tipo de relevo ou formação de rochas carbonáticas. Ou seja, toda formação geológica formada pela corrosão da água sobre rochas solúveis carbonáticas como  calcário e dolomito é um carste.

     O calcário e o dolomito são as rochas carbonáticas sedimentares mais importantes e diferem em termos de idade e formação. Essas rochas contêm mais de 50% de minerais carbonatos representados, principalmente, pela calcita e a dolomita, amplamente utilizados em diversos processos industriais, como na neutralização de solos, já que a dolomita neutraliza a acidez do solo e fornece nutrientes adicionais como magnésio e cálcio. (TRAVASSOS; VARELA, 2022, p. 15).

  Esses tipos de rochas são extremamente importantes como recurso econômico nacional e regional. Sua ocorrência favorece tanto a geração de milhares de empregos diretos e indiretos, como o fornecimento de água potável.

     Assim, o nome carste tem origem na palavra eslava karst, que significa “campo de pedras calcárias” e também designa uma região de relevo carbonático da Europa. Portanto, o termo passou a ser utilizado para se referir ao relevo formado em rochas carbonáticas em geral, incluindo as cavernas. 

Caverna formada por um processo cárstico. Localizado na Postojna, Eslováquia

    

Caverna. Postojna, Eslováquia

Buraco das Araras - Goiás, Brasil. (Dolina)

Fonte: internet. Registro da parte interna da dolina Buraco das Araras, em Goiás.

“Dolinas são depressões resultantes da dissolução e do colapso de rochas solúveis, especialmente calcário e dolomito" - que também fazem parte do relevo cárstico.

Elas surgem quando a água, naturalmente ácida, infiltra-se em fraturas, dissolvendo gradualmente a estrutura mineral e formando câmaras subterrâneas. Então, com o tempo, o teto dessas cavidades perde sustentação e desaba, gerando um poço de queda abrupta.

       No entanto, o carste além de criar paisagens exuberantes, possui uma importância econômica e biodiversa vital para a sociedade. Um exemplo, é a Regulação Hídrica: a drenagem no carste funciona como um captador e transportador de água em alta velocidade, auxiliando na distribuição hídrica entre diferentes zonas de recarga e descarga.

  Um outro exemplo específico de como um sistema cárstico contribui para a distribuição de água em uma região é o da Caverna do Diabo (Gruta da Tapagem). O sistema hídrico da Tapagem configura-se como importante recarga hidrológica da região, envolvendo drenagens como o Rio das Ostras, o Rio Pardo e o Rio Ribeira. 

  As áreas de carste, também, destinam-se à extração de matérias-primas para indústrias de construção civil e bens de consumo, como o calcário. Além de atuar  na biodiversidade como habitat para muitas espécies ameaçadas, como os troglóbios, animais totalmente adaptados à vida dentro de cavernas. Exemplos desse grupo incluem diversos tipos de peixes (como o bagre-cego de cor rosada), insetos, crustáceos, anelídeos e aracnídeos). 

Esses animais estão ameaçados permanentemente de extinção devido a sua vulnerabilidade biológica. Os troglóbios possuem populações pequenas e demonstram baixa tolerância a variações ambientais. Eles vivem em um habitat muito particular (chamado de habitat cavernícola ou hipógeo), onde as variações de temperatura são muito pequenas e a umidade do ar geralmente é elevada. 

   Sua extinção pode ser acelerada devido ao fluxo de visitantes, gerando processos irreversíveis diante do turismo inadequado. 

   Ainda, no interior das cavernas, podem ser observadas, formações pontiagudas conhecidas como espeleotemas, entre elas a estalactites - que são desenvolvidas a partir do teto - e estalagmites - que crescem a partir do chão da caverna-, elas nos dão  informações preciosíssimas sobre o clima do passado, revelando períodos de seca, de chuvas intensas e até mudanças na vegetação. 

    Para além desses conhecimentos valiosos, durante o curso, foi muito ressaltada a importância da interdisciplinaridade, tanto em relação aos conceitos abordados quanto às metodologias utilizadas. Isso porque acredita-se que, ao conectar diversas disciplinas ao redor do tema das cavernas, o aprendizado se torna mais significativo, os conteúdos ganham sentido prático no dia a dia dos estudantes e abre-se espaço para formar cidadãos mais críticos, criativos e conscientes.

   Entretanto, apesar dos resultados positivos, não se pode deixar de encarar os desafios: muitos projetos ainda não refletiram toda a interdisciplinaridade possível. O principal entrave foi a dificuldade de trabalho em equipe, causada pela falta de diálogo entre profissionais de diferentes áreas do conhecimento, perfis diferentes e a sobrecarga de professores em mais de uma escola. A falta de tempo para planejar, a rigidez dos currículos e a pouca coordenação da gestão escolar também dificultaram os avanços, além da permanência de métodos de ensino tradicionais que limitam práticas mais criativas.

E assim, chegamos ao fim de mais um capítulo!

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Abraços,

Folha de Mica

  • Existem outros processos de formação de cavernas que não são por dissoluções; mas vale a ressalva que neste texto de divulgação científica só foi abordado o processo relacionado às cavernas cársticas.

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